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06/05/2008

Pelo ir. Pelo vir.

Num final de tarde de maio, um humilde senhor de rosto enrugado e cabelos ralos e bem branquinhos faz sinal para o ônibus que pára próximo ao meio-fio e abre as portas. Com as mãos preparadas pro impulso que o colocaria no ônibus ele é interrompido:

- Senhor, onde está o seu passe? Não, Não... Neste ônibus tem câmera, e o senhor só pode entrar com algum documento...

Portas fechadas.

Um humilde consentir, mãozinhas nos bolsos, que deviam estar vazios, e aquele velho rosto ficou pra trás na calçada.

Não é a primeira vez que sinto meu coração apertar com situações assim.

Por diversas vezes, em tardes de domingo muito quentes, esperando um ônibus [demorado] no Terminal Rodoviário de Niterói, a imagem de velhinhas sentadas em banquinhos que têm que esperar o próximo ônibus de meia hora de freqüência, pois este que chegou não “oferece gratuidades”, me deixava muito inconformada.

A indignação vem com a constatação de que, na prática, quem compra a dignidade é o dinheiro. Diretamente, pois R$2,70 me garantiram um assento ali, e eu me envergonho por ter consciência de que eles (aqueles idosos) são tão gente quanto eu. Indiretamente, pois a falta de informação e educação não lhes permite conhecer seus direitos e deveres, assim como os da empresa. E assim funciona o sistema. As vidas não importam. A Empresa tem um dono, e a propriedade privada se desdobra em conseqüências negativas ou positivas resguardadas pelo próprio sistema. No direito de “ir e vir”, presente na Constituição, foi-se esquecido de apresentar a ressalva: desde que pague a sua passagem.

Nada mais justo, não é? O empresário não tem que sustentar ninguém...

É esta a nossa sociedade. A burocracia não sente a dor. Este mesmo modelo aplica-se no acesso à educação, à saúde, à moradia digna...

Quem nos faz acreditar que um outro modelo de sociedade, uma nova forma de pensar, não é possível? Nestas horas eu não posso deixar de pensar no modelo de sociedade que Jesus propôs, e como devemos nos portar enquanto cristãos.

Esta é minha utopia. Que um dia o Amor e o respeito, por conseqüência, sejam o passe-livre dos idosos. Que o Amor seja motivo pra que o excesso de pão que apodrece nos estoques de uns, alcancem os que estocam fome. Que o Amor constranja a falta de esperança. Que o Amor seja a motivação que nos faz cuidar da natureza com o mesmo zelo com que cuidamos dos nossos próprios corpos. Que o Amor nos faça priorizar os outros seres-humanos, assim como o fez Jesus, e não a burocracia, as regras, ou a própria doutrina...

E que o próprio Amor de Deus nos faça perceber enquanto humanos errantes, miseráveis, e por isso, carentes dEle.

Um comentário:

Anônimo disse...

Li este texto no site da igreja.
Achei fantástico.
Muito bom! Continuemos e progridamos no amor de Deus.
Beijos mil.