Nesta semana vi/li duas coisas que me deixaram
intrigada. É bom quando uma imagem ou conjunto de palavras nos põe
pra refletir sobre nossas posturas [e nos dá consciência sobre o
que pode causá-las]
Na primeira, um trecho pequeno de uma fala do
Rubem Alves no documentário “Rubem Alves: o professor de
espantos”, em que ele questionava o porquê das pessoas não
prometerem a Deus coisas boas, como ouvir uma determinada música
linda, comer algo gostoso de vez em quando, ter mais prazer em seu
cotidiano com atividades específicas, até o fim da vida... Ao invés
disso, prometiam apenas “casca de ferida” nas palavras dele, como
subir centenas de degraus de escadarias de joelhos, não comer
determinada coisa e etc., como se Deus ficasse “babando de prazer
ao saber dos sofrimentos”.
A definição de promessa segundo o dicionário é:
"Ação
ou efeito de prometer.
Voto feito aos santos ou a Deus para obter alguma graça."
Voto feito aos santos ou a Deus para obter alguma graça."
Neste sentido até compreendo que a vontade de obter algum favor ou
“milagre” que fuja à capacidade humana realizar, como a cura de
uma doença grave ou coisa semelhante, faz a humanidade apelar à
força da religião. Religião no sentido de controlar a divindade.
Barganhar com o inatingível.
Não pretendo fazer aqui um texto teológico. Muito menos comparar
Promessas neste sentido que conhecemos, com Jejum. [Aquele jejum do
arrependimento, do quarto e da intimidade, da renovação de mente e
de posturas]
As “promessas-casca-de-ferida” que legitimam a visão platônica
na qual Agostinho, Calvino e os reformados beberam, que transforma o
mundo ideal em algo inatingível e que desmerecem e condenam a
matéria, o mundo-casa, o corpo. Que ressuscitam um deus medieval. A
essas, sim, me oponho.
A vida é a maior criação de Deus.
A matéria manipulada por ele era boa. E viu os corpos e disse “É
muito bom”.
E comemorou a criação descansando.
A luta pela justiça, as lágrimas ao guardar a miséria uns dos
outros no coração [miseri-cordis], o acolher dos órfãos e viúvas,
os bem-aventurados “fazedores” de paz [pacificadores, não
passivos], os que sofrem perseguição de morte por amor à vida, que
inalam gás-lacrimogênio.... Os que descobrem e dedicam suas vidas à
ciência da cura das doenças, os professores que instrumentalizam a
emancipação das mentes e corpos, as aflições que teremos no
mundo, os militantes conhecedores e promovedores dos direitos dos
oprimidos... Me parece que tudo gira em torno de uma busca por vida
abundante. E vida abundante aqui. Terra, matéria, mundo.
O fim da
fome é necessário, pois só assim se faz poesia.
O corpo almeja a
cura da doença para desfrutar uma boa dança.
Os olhos marejados
lutam pela justiça para que não haja água e sal entre a dor e a
beleza do pôr-do-sol.
A criança amada e segura é capaz de brincar
e aprender.
Toda a criação, [o universo] e a coroa da criação, [a humanidade]
deve a Deus a promessa de desfrutar e garantir que se desfrute com
justiça, a poesia, a brincadeira, os cheiros, gostos, movimentos e
sons que Deus nos deu. A melhor promessa que se pode fazer àquele
que presenteia, que dá de Graça, é garantir que o presente será
desfrutado ao máximo de seu potencial. Prometer que daremos os
melhores e mais profundos sorrisos de gratidão. Sem medo da
inutilidade da arte e do prazer.
No sétimo dia, o prêmio é o
descanso....
Ah, e ainda lembrando o Rubem Alves que uma vez disse que a gargalhada era um espasmo de sinceridade incontrolável. Uma gargalhada não se finge. O riso também foi condenado pelos religiosos [aqueles que provavelmente não entenderam muito sobre a vida...] Reproduzo abaixo a ironia do cartunista do site "Um Sábado Qualquer" sobre o medo dos religiosos com o verbo "brincar".
E é esta a segunda coisa que me provocou a reflexão compartilhada acima.
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